José estava longe de casa e preso injustamente em um lugar com duas pessoas estranhas, mesmo assim ele interagiu com cada um deles verdadeiramente e utilizando os dons que havia recebido de Deus (Gênesis 40).
José estava enfrentando, além desse isolamento, uma sensação de injustiça, pois havia sido preso por tentar fazer o que era certo. Naquele lugar de desprezo ele se viu encolhido em memórias de tempos melhores.
Ele teve que enfrentar a angústia de olhar para os lados e não ver um semblante familiar e ainda ter que apoiar as dores daqueles que estavam junto com ele, talvez na mesma situação de saudade.
Muitas vezes nos sentimos longe da nossa família e isolados daqueles que conhecemos intimamente. Essa é uma sensação dolorosa, pois nos sentimos um estranho no meio de costumes diferentes dos nossos.
São momentos assim que abrem espaço para que os pensamentos nos deprimam e nos deixem alheios a nossa visão. A tristeza embaça a capacidade de enxergar um futuro de novos momentos de riso.
Porém, ele não desistiu de ter esperança, não apenas de sair daquele lugar, mas de rever sua família e poder estar inclusive com os irmãos, que o haviam rejeitado, humilhado e vendido como escravo.
Naquele lugar distante de tudo e de todas as possibilidades de contato com seu conforto, ele deve ter sentido o frio que obrigava seus próprios braços a lhe envolverem, trazendo a lembrança de casa.
Existem vários momentos em que as pessoas se sentem assim, mesmo estando acompanhado daqueles que mais amam. A mente se fecha em um escudo impenetrável e que promete falsa proteção.
Os jovens de hoje estão se fechando em seus quartos e ninguém é capaz de arriscar dizer o que acontece nesses momentos de solidão quase voluntária. Os pensamentos vagueiam por planos de “liberdade e independência”.
Os pais não conseguem nem entrar nesses quartos, que são verdadeiras masmorras, então quem dirá que consigam entender o que se passa na mente desses pequenos adultos que sonham em “crescer”.
Eles até se perguntam o que aconteceu com seu bebê, que não lhe dá mais atenção e não busca mais os seus braços acolhedores, nem seus conselhos sábios. Mas, a cada dia que passa, a prisão juvenil o acolhe mais.
José estava na presença de um padeiro e um copeiro na sua cela. Dois personagens estranhos. E foi para um deles que José pediu para ser lembrado, que o ajudasse a sair daquele lugar sombrio e assustador.
Imagino que os pais nem saibam quantos padeiros e copeiros imaginários ou virtuais façam parte da vida de seus filhos. Eles nem sequer conseguem mais penetrar na mente “menos” experiente das crianças crescidas.
E dessa forma o adulto atual vai se formando e essas criaturas desconhecidas se tornam a única esperança de voltar para casa. Mesmo quando se pensa que a verdadeira vontade seja de sair dela.
Os pais não percebem como isso aconteceu e se debatem nos questionamentos e autocríticas, porém esquecem que o básico do acolhimento é sempre a melhor solução para trazer o filho de volta.
Muitos pais recorrem aos seus próprios pais, na tentativa de saber o que fazer, como eles fizeram e o que pode ser aproveitado de bom na sua história. História essa que eles mesmos tentaram esquecer, por muitas vezes.
Há quem diga que o isolamento seja natural de algumas idades, mas não concordo muito que exista um padrão único para todas as pessoas. Talvez seja preciso rever em que ponto a relação começou a se desligar.
Pais e filhos são formas de expressão divinas, pois o próprio Deus nos chama de filhos e enviou o seu unigênito, no qual temos o exemplo perfeito de relacionamento com o pai dos pais. Totalmente disponível.
Todos os exemplos que regem e moldam o caráter de uma pessoa são aprendidos em casa e não em escolas caras, que muitas vezes se tornam responsáveis pela educação dos filhos de pais muito ocupados.
Para essas crianças, o ato de chegar em casa significa voltar para um lugar de espera, onde o tempo passa devagar, junto com os recursos virtuais, até que chegue o momento de sair dali e viver de “verdade”.
Infelizmente, essas crianças, adolescentes e jovens vão se tornar adultos com pouco recurso para lidar com frustrações e não há como negar que a vida está cheia delas. Isso é muito triste de assistir e é muito real.
Há também os pais que se perguntam onde falharam, pois deram amor, carinho, criaram regras, fizeram tudo conforme os livros ensinam, mas esqueceram de uma coisa: entrar na mente dos filhos.
Não existe tal poder, é claro, mas uma relação de confiança, respeito e facilidade de comunicação pode garantir que as prisões do isolamento se abram e os copeiros e padeiros dos filhos passem para segundo plano.
Não é simples reatar relações, mas é totalmente possível, através de compreensão e de um processo sadio de humanização, no qual os pais choram, riem e sentem as dores e as alegrias juntamente com seus filhos.
Outros pais preferem se dizer “amigos” dos filhos, mas essa confusão de papeis não têm mostrado muitas evoluções de intimidade. Pelo contrário, têm distorcido o significado das palavras: respeito e obediência.
Nesses casos os filhos até saem um pouco das suas masmorras emocionais, mas não deixam de buscar seus paliativos nos copeiros e padeiros, que os desafiam mais do que seus próprios pais conseguem fazer.
É uma relação realmente intrigante e cheia de desvios possíveis, mas é totalmente viável recuperar laços perdidos e, melhor ainda é evitar que isso aconteça. O importante é não desistir, sem desespero e buscar ajuda.
A individualidade de cada mini pessoa está sendo formada por aquilo que ela aprende dentro de casa, pela relação de seus pais entre si e com os avós. É como um filme educativo que não para de rodar na mente dos filhos.
É muito fácil para os pais fugirem de relações difíceis com os avós e acharem que isso vai proteger a criança, mas na verdade está criando um leque de opções de como fazerem do mesmo jeito, cheios de raiva e mágoas.
É totalmente ilusório acreditar que o afastamento dos filhos dos avós, que foram pais “duros”, irá tecer uma forma nova e original de educação. Pois aquilo que não está resolvido em uma geração, segue a próxima.
Muitos pais se acham tão donos da verdade única e exclusivamente correta que não percebem que os filhos não estão conseguindo mais encontrar opções de relacionamento dentro de casa. Então a rigidez os sufoca.
As opções podem e devem ser esclarecidas em papéis muito bem definidos, em um convívio de comunicação aberta e emocionalmente honesta. Pois se as prisões estão estabelecidas, será mais difícil abrir as portas.
Há quem faça tudo o contrário dos pais na educação dos filhos, mas não entendo como isso pode funcionar, já que não há nada de autêntico nesse tipo de escolha. O mesmo acontece para quem insiste em repetir padrões.
Seria ótimo que existisse uma solução única para cada caso e que pudesse ser escrita aqui, mas infelizmente não é possível. Cada vida mostra suas particularidades e até as prisões emocionais variam.
Somos totalmente responsáveis pelos exemplos que damos e nossas relações são observáveis e autoexplicativas, com direito às intervenções das imaginações dos pequenos adultos que estamos formando.
Então, ficamos em um ponto de reflexão de onde e quando uma relação começou a se perder e acreditar que ninguém foge para sempre. Portanto há sempre uma esperança do filho pródigo voltar para casa.