Jó | Meu mundo

Quando a dor se apodera de nós, desejamos que tudo ao nosso redor pare. A vontade é de que o mundo altere seu comportamento por nossa causa. Afinal, o nosso está desmoronando e não parece justo que ninguém note.

Ficamos inconformados só em saber que tudo lá fora continua a girar normalmente. Que ninguém tem a sensibilidade de parar o que está fazendo para nos amparar e fazer ir embora os gemidos do nosso coração.

Mas, a vida continua e não temos forças para estagná-la. Lamentamos, brigamos, negamos e tentamos pensar em outra coisa, mas não há um remédio certo, pronto e específico para fazer cessar os aborrecimentos da vida.

Jó, com certeza, gostaria que a terra parasse para acudi-lo, mas, nem ao menos seus amigos estavam dispostos a isso. Pelo contrário, ele ainda tinha que ouvir que estava sendo egoísta, além de outras coisas.

O mundo daquele homem havia sido abandonado pelas pessoas mais íntimas e de sua confiança. Ele devia olhar para todos os lados e não enxergar ninguém disponível para falar sobre os seus lamentos, do seu jeito.

Facilmente ele teria chorado e, talvez, aliviado um pouco a força daquele luto, se algum dos seus amigos estivesse dando ouvidos e apenas ouvidos ao que ele dizia. Mas, o homem estava sendo colocado contra a parede.

Quando Bildade questionou se a terra seria abandonada por causa de Jó, ele não estava na vibração de ajuda. Ignorou que, para quem está em dor intensa, o mundo parou, acabou e foi abandonado, de fato.

A resposta para tal pergunta é sim. A terra precisa ser abandonada por minha causa, o mundo precisa notar o que estou passando, mas não o planeta inteiro, apenas o mundo daqueles que estão por perto, com o papel de apoiar.

Na realidade presumida de cada um está a necessidade natural de ser acolhido, sem exceção. Fomos feitos com a vontade de nos sentirmos parte de algo maior que nós mesmos, que nos puxa para outras pessoas.

E quem faz parte do nosso convívio precisa entender que não é egoísmo querer ser ouvido, pois, todos passam por momentos em que essa carência é maior e mais acentuada pelo sofrimento, em qualquer nível.

Fazer de conta que a pessoa saberá se manter estável em uma crise tão pesada como a desse homem, é querer desmentir a própria natureza humana. É querer negar que o que está acontecendo é capaz de sacudir o normal.

Jo.18.4 - Meu mundo

Meu mundo parou e não espero que a terra pare de girar por minha causa, mas espero que o mundo de algumas pessoas seja mexido junto com o meu. Espero que haja sensibilidade para perceber que não quero me sentir só.

A força que coordena o movimento dos planetas, também faz o mesmo conosco. Se um planeta parrasse, todos os que estão por perto seriam os primeiros a sentir a mudança e que algo anormal está acontecendo.

Tudo mais ao redor precisa se compadecer com aquela parada e entender o que está acontecendo em seus ricos detalhes, pois, certamente, as demais órbitas irão sentir o efeito. Basta atenção e paciência para ouvir.

Muitas vezes, só é preciso um pouco do tempo com o mundo parado, sem outras preocupações e distrações, mas, totalmente voltado para o centro daquela situação que não representa a normalidade dos movimentos.

Um olhar compartilhado ou um suspiro, de quem está disponível de verdade, pode ajudar mais do que muitas palavras sábias e apressadas. Existem várias coisas a serem ditas, mas que, sem emoção, não possuem efeito.

Sem uma conexão genuína com o próximo não surtimos o alcance desejado. Não somos capazes de colocar as peças no lugar adequado do seu encaixe e não suprimos um dos maiores e gerais desejos: o acolhimento.

É fascinante o poder dessa engrenagem de relacionamentos, que é capaz de fazer mundos voltarem a girar e ainda de torná-los mais agradáveis. Em toda e qualquer situação, essa é uma necessidade básica do ser humano.

Não há dinheiro, socorro ou conselho que substitua o resultado do acolhimento. Não conheço, pelo menos, algo que consiga fazer com que duas pessoas se sintam tão à vontade para compartilhar emoções, boas ou não.

Este também é um sinal de amor, de sensibilidade e aptidão para as variadas circunstâncias da vida que exigem firmeza de relacionamentos. Independentemente da situação, somos capazes de explorar um ato tão nobre.

E, diante dos problemas mais complexos, os quais não sabemos nem o que dizer, podemos cavar um pouco mais dentro de nós mesmos, em busca dessa força vital para fazer a roda girar em benefício mútuo, completo e funcional.

Temos medo de amparar a dor por não sabermos o que e como falar, mas, nem sempre isso é preciso. Muito pouco pode ser exigido de nós em momentos que precisamos ser um apoio, pois, ser autêntico deveria ser simples.

Jo.18.4 - 1Ja.4.8

Deus é amor e isso foi mostrado da forma mais bela que existe, que é a autodoação. Ele se entregou para que tivéssemos um relacionamento com ele e com os que fazem parte desse propósito supremo, cheio de novidades.

Foi-nos ensinado como ser, agir e o que precisa ser feito para que haja um fluxo de conexão interminável. E o melhor de tudo é que temos ferramentas de ligação dentro de nós, prontas para serem usadas, sem limites.

Se entendermos que a nossa vida precisa de sentido e só o conseguimos quando transcendemos a nós mesmos, para ajudar o próximo, nos sentiremos menos solitários. Enquanto focarmos no individual, tudo ficará vazio.

Parece haver algum tipo de magnetismo que une as pessoas, através do sofrimento. Nas piores horas, conhecemos a todos como são, de fato, sem censura. Inclusive, nos enxergamos como realmente somos.

Ajudar alguém nos dá uma satisfação única, que não existe com o que comparar. É um salário que nos remunera de uma forma singular, imediata e duradoura. Acontece uma conexão maior do que em momentos alegres.

A nossa ajuda tem uma função palpável no nosso organismo, pois parece que ganhamos um terceiro pulmão e respiramos melhor. O que quer que tenha custado, sempre irá valer a pena e se transformará em retorno.

Essa força projetada do e para o nosso ser, ao se compadecer de alguém, é muito além de qualquer dor que estejamos sentindo. Ela é natural e inquebrável, como a lei da gravidade. Faz parte do projeto de todo ser humano.

Nos sentimos compreendidos, iguais, aceitos e principalmente acolhidos. Parece que, com esse movimento, nos assemelhamos mais a Deus. Que pode ser considerado o melhor exemplo de sacrifício vivo (2 Coríntios 5.15).

A dor une pessoas, verdadeiramente, pois, essa é a forma da maestria divina em chegar na humanidade. Através do pior sofrimento de todos os tempos, hoje somos salvos e possuidores de uma vida que nunca termina (João 3.16).

Aprendemos demais com o Senhor se formos seus imitadores, seja no conforto ou não. Em toda e qualquer situação somos parte de algo amplo e que envolve uma teia de relacionamentos preparada para funcionar.

Por isso e muito mais, com atenção à história de Jó, vemos que seus amigos não conseguiram se conectar a ele. Importava mais estarem respaldados por sua própria sabedoria, do que estender a mão para um amigo querido.