Jó | Perdão

Eu não poderia deixar de concluir a reflexão sobre essa história, sem enfatizar um aspecto tão divino, em termos de relacionamento. Não vou fazer definições, nem ensinar modos, mas gostaria de dar apenas uma opinião.

Entendo que o perdão é a expressão de amor mais prática e eficiente que conheço. É algo que não se consegue imitar, desmentir e nem deixar de perceber seus resultados de dentro para fora, no espírito, na alma e no corpo.

Jó perdoou seus amigos e orou por eles. Deixou o seu sofrimento de lado, passou por cima das palavras de acusação que havia ouvido e de todo o seu conhecimento pessoal para seguir o modo divino de pensar.

Se formos analisar o que aconteceu com este homem, através dos olhos naturais, da razão e até os emocionais, tudo vai ficar explicado pela metade. Não temos a sabedoria necessária para entendermos a mente de Deus.

Mas, se tivermos que dar uma conclusão para o que aconteceu com a pessoa principal dessa história, eu me arriscaria em falar do perdão. Jó conseguiu transformar a sua dor e as perdas vividas em um ato de oração e sacrifício.

Ele teve algumas chances de desistir de tudo e de deixar que a falta de compreensão das pessoas lhe abatesse. Gemeu, reclamou e expirou suas últimas energias, na tentativa de convencer quem não lhe dava ouvidos.

Foi oprimido, julgado e humilhado. Passou por uma agonia que foi difícil de descrever em palavras, mas, ele tentou de todas as formas, sem conseguir audiência. Parecia que ninguém se preocupava com a sua situação.

Perdeu tudo e todos. Se viu na mais sombria escuridão da solidão e, mesmo quem ainda lhe restava, lhe rejeitava. Seu cheiro, sua aparência e suas palavras não deviam mesmo agradar ninguém que passasse por perto.

Ele se sentiu o último dos homens, se viu na sepultura e narrou essa visão, inclusive, amaldiçoou o dia em que veio ao mundo. Seu desejo era nunca ter tido que experimentar tamanha vergonha, falta de esperança e medo.

Pode-se dizer que esse homem foi triturado vivo pela vida. Sofreu o que poucos podem dizer que conhecem e viveu o que quase ninguém consegue entender. O que, pelo visto, nem ele mesmo estava conseguindo.

Sua experiência exclusiva virou um exemplo e parte integrante da maior mensagem já escrita em toda a história da humanidade. Afinal, é difícil que alguém não conheça o livro bíblico que tem o seu nome como título.

Jo.42.10 - Mt.5.44

Falemos então do maior exemplo de todos. Jesus é a prova viva do perdão de Deus para os homens. Ele veio com essa missão e a cumpriu com mansidão, humildade e poder, já que, seus ensinamentos sempre falavam disso.

Essa é a raiz que sustenta o tronco, os galhos e as folhas de todos os relacionamentos. Sem a compreensão e prática deste fundamento, algo irá ficar faltando e não encontraremos paz nos diversos convívios que nos cercam.

Não existe e não irá existir a ausência da necessidade de perdão, durante o trajeto da vida. Pois, algo que nasceu em Deus não pode, nem deve morrer na mente humana, precisa ser dissipada em direção ao próximo.

Esse é um princípio de sabedoria que nos torna fisicamente mais leves, emocionalmente mais soltos e espiritualmente prontos para também recebê-lo. Nós aprendemos isso com o mestre dos mestres (Mateus 6.15).

Portanto, é possível experimentar a prática dessa ação através de uma das mais sublimes formas, que é a oração. Falar com Deus e pedir algo bom para quem nos ofendeu, nos torna mais parecidos com o criador.

O próprio Jesus fez isso durante a sua crucificação, pedindo pelo perdão daqueles que estavam lhe mantando. Ele mostrou que, mesmo com tamanha dor, ainda conseguia pensar daquela forma (Lucas 23.34).

E, como falamos, Jó praticou o perdão, através da oração que fez pelos amigos, pois, preferiu a forma divina de pensar ao invés de carregar o peso da mágoa. Ele preferiu a paz de deixar para Deus o que só Ele suporta.

Jó não quis carregar mais uma ferida aberta, além das que já tinha em seu corpo. E usou esse recurso para diminuir a sensação da frustração e da decepção, conquistando uma mente livre de ressentimentos.

Não deve ter sido fácil, como não é para ninguém. Mas, seguramente, este é um princípio que dá sentido à liberdade. É uma forma de vencermos as nossas batalhas diárias com os sentimentos que estão baseados em rancor.

Quando perdoamos alguém, estamos dando um presente a nós mesmos e nos superando de forma grandiosa. Somos colocados em outro patamar de maturidade e conseguimos ser mais satisfeitos com nossas decisões.

É muito pesado ter que carregar a falta de perdão e é uma sensação que ninguém precisa passar por ela ou ficar estancado na mesma. Fica muito complicado ter que conviver com os nossos pensamentos, sem perdoar.

Jo.42.10 - Eu perdoei

Eu decidi perdoar para não ter que viver no cárcere da maior mentira que acreditei durante muito tempo, que foi a que nunca magoei ninguém. Fiz isso sim e espero que todos tenham me perdoado também.

Sabia que não queria fazê-lo e também não via mudanças nas pessoas que eu perdoava, mas, acreditei que aquilo era para mim e não pra elas. Embora, em alguns momentos, tenha pensado que estava passando por humilhação.

Foi então que entendi a diferença entre ser humilhado e ser humilde e compreendi que uma ação, simples como essa, era capaz de me abrir os olhos para um novo horizonte de opções. Pouco a pouco me tornei mais sábio.

O problema é que isso nunca acabava. Não paravam de acontecer situações que me exigiam esse esforço enorme. Só que, cada vez se tornava mais simples e parte da minha forma de pensar e perceber tudo ao meu redor.

Vi que algumas pessoas que mais me magoaram foram aquelas que mais me amaram. E, mesmo que não se tratasse dessas últimas, consegui ter mais condições de entender o que estava acontecendo de verdade.

Eu tive que desconstruir muitos pensamentos e transformá-los em tolerância e oportunidades de recomeço. Então, somente dessa forma, eu podia ter a sensação de que tinha feito tudo que estava ao meu alcance.

A vida me ensinou bastante. Nessa escola de experiências incríveis, eu aprendi que não vale a pena negar certos ensinamentos de sabedoria, como esse, por exemplo. Aprendi como quem entende do assunto.

Fui quebrado e reconstruído, passei por várias decepções e vi que, sem perdoar, eu não conseguia me mover. Tudo orbitava em torno das mágoas que eu carregava e meus planos de justiça nunca me satisfaziam.

Pois é, dessa forma eu resolvi ceder rapidamente ao que me deixa em paz. Entreguei o senso de verdade, justiça e razão a quem as possui de fato. Passei muito tempo tentando o contrário, mas, nada funcionou tão bem.

O perdão é isso. É saber que não precisamos ficar presos ao que acreditamos ser a solução e nos desencarregar de responsabilidades que não são nossas. Pode ser que eu nem veja o que acontecerá depois, mas já estou livre.

Em mim, foi plantada essa semente que eu tive que regar, cuidar e ver crescer, bem devagar, mas valeu a pena. Não importa a situação, os sentimentos envolvidos, nem o que eu penso que posso fazer. Eu perdoei.