Reis | Sem ouvir

Não tinha ouvido

[1 Samuel 14.27]

Em uma das batalhas de Saul, ele proibiu o povo de comer até que o dia terminasse, porém, seu filho Jônatas não tinha ouvido essa determinação real e acabou comendo um pouco de mel, na terra inimiga.

Logo ele foi alertado do que o rei havia dito e parou de comer, dizendo que seu pai havia feito uma grande bobagem, pois todos estavam muito cansados e, só de comer um pouco de mel, ele se sentia bem para lutar.

Ao saber que seu próprio filho havia cometido essa falta contra sua ordem, Saul não o quis poupar, mas o povo não aceitou sua condenação, já que ele havia sido guiado por Deus numa batalha de vitória.

Enfim, Saul não parecia refletir muito sobre suas ações de governo e suas decisões estavam se tornando cada vez mais imprudentes e sem direção divina. Não bastasse, sua voz parecia não estar sendo ouvida.

Seus erros estavam se tornando em prejuízo para ele e sua família, de forma nitidamente declarada para todos que eram governados por ele e seu papel ficava cada dia mais obsoleto, no sentido de confiança.

Enquanto isso, a credibilidade do seu filho parecia crescer diante do povo. Uma vez que todos estavam participando de perto das suas várias formas de mostrar aquilo que seu pai não conseguia executar com sanidade.

Ou seja, Jônatas quase foi punido por uma ordem que o rei não teve capacidade de comunicar com eficiência, colocou sua ponderação de forma muito justa, se dispôs a obedecer e ainda foi protegido pelo povo.

No final das contas, estava parecendo mais uma inversão de papéis entre pai e filho, entre rei e príncipe. Tudo causado por um desequilíbrio familiar de um pai que quis matar o próprio filho e do rei que desobedecia a Deus.

A história daquele homem estava sendo contada pelas suas imprudências e desgovernos, sua imagem estava sendo criada pela desestrutura da descrença e desobediência, seu reinado estava realmente no fim.

E, sem nem mais ouvir o que seu pai tinha a dizer, ou mesmo o que o rei queria ordenar, estava um filho, um rapaz que tinha seus próprios sonhos e expectativas por fazer parte de uma família tão importante.

Ele que devia sentir falta da presença e do apoio paterno e que devia estar tentando administrar a decepção de ver o pai indo por caminhos tão desconcertantes. Um filho sem pai e um príncipe sem rei.

Mudando a

Forma de falar

Não dá pra entender como Saul ainda quis punir Jônatas por uma ordem não cumprida, mas que ele não teve nem a oportunidade de ouvi-la. Que tipo de justiça pensou-se estar fazendo é realmente uma incógnita.

Depois de tantas ordens do próprio Deus, que ele mesmo desobedeceu, se deu o direito de ser tirano ao ponto de autorizar a morte do próprio filho, sabendo que era seu papel, como rei, comunicar e, como pai, proteger.

Mas, preferiu ser juiz alheio a olhar para seus próprios erros, talvez até punindo inocentes próximos por aquilo que ele mesmo havia causado, deixando seu filho em uma situação de desamparo injusto.

Isso mesmo. Jônatas não teve o direito de ouvir a orientação do rei, porém teve que ouvir a condenação vinda do próprio pai, que não pareceu ter relutado muito para evitar que algo de ruim lhe acontecesse.

Sendo assim, vamos tentar trazer um pouco dessa história para um contexto mais atual, que nos leve a uma percepção do que está acontecendo entre pais e filhos, no tocante às mensagens perdidas.

Os pais pensam que são ouvidos sempre, mas isso não é bem verdade. Algumas coisas ficam tão repetitivas e cansativas de escutar, que levam os filhos a entrarem em um modo de surdez deliberada.

A criatividade das falas foi se perdendo com o tempo e a forma particular de entendimento passou a dar lugar à indiferença, considerando que já se sabe o que vai ouvir e nem sequer existe a vontade de dar atenção.

Perdeu-se a credibilidade de que algo novo será dito e que irá aparecer alguma coisa que crie desafios mentais. Isso quer dizer que alguém dirá a mesma coisa e outro terá que ouvir tudo de novo.

Assim, as conversas deixaram de ser interessantes e passaram a ser enfadonhas, pois o mesmo que era dito a um filho de dez anos continua sendo repetido da mesma forma quando ele chega aos quinze.

Isso não pode acontecer. As pessoas passam por muitas fases do ciclo da vida e estão em constante desenvolvimento, com mudanças que acontecem biológica e psicologicamente, ou pelo menos é o que se espera.

Elas não precisam ouvir tudo do mesmo jeito, sempre. Pois, mesmo que a mensagem não deixe de ser transmitida, ela precisa ser reinventada para alcançar seu destino da forma que é compreendida naquele momento.

O alimento sólido é para os adultos

Hebreus 5.14

Até a Palavra de Deus, que não muda, permite o respeito pelo ciclo de vida espiritual de quem a recebe. As crianças são alimentadas de leite e os mais maduros na fé precisam de alimento sólido.

Em torno desse conceito esplêndido, os pais deveriam perceber a fase vital de seus filhos e se assegurar de que estão recebendo o alimento verbal na consistência adequada, ainda que seja o mesmo de anos atrás.

Isso poderia evitar o movimento ensurdecedor de adolescentes e jovens adultos que preferem não ouvir mais seus pais com a mesma atenção que um dia foi dispensada, já que não estão sendo alimentados coerentemente.

Ou seja, existem vários casos de desligamento emocional que não serão citados neste contexto, mas é importante alertar que a grande parte deles está ligada à falta de sabedoria para se comunicar, garantindo o entendimento.

Assim como Saul, que puniu seu filho por uma desobediência, sem certificar-se da eficiência da sua comunicação, os pais de hoje estão fazendo o mesmo, de muitas outras formas e vendo seus filhos cada dia mais distantes.

Por isso, está na hora de tomarmos a responsabilidade pela perpetuação da nossa voz, como pais, com uma preocupação organizada de como ela tem surtido o efeito adequado para cada etapa de vida dos filhos.

Já que não adianta esperar que o alimento de ontem tenha sempre o mesmo efeito que teve naquele dia. Faz-se necessária a criatividade e espontaneidade para conhecer os filhos e saber o que já estão prontos para ouvir.

Pois, o paladar auditivo é criterioso e pede por novos sabores à medida da sua maturidade, o que não pode nem deve ser ignorado pela displicência de não notar que um filho cresceu e suas necessidades mudaram.

Não adianta dar alimento sólido para uma criança e achar que ela vai conseguir comer sem engasgar-se, podendo causar danos maiores. Da mesma forma, um jovem ou adulto não vai querer comer comida de bebê.

Portanto, um pai precisa estar consciente do seu papel como comunicador e não apenas colocar a responsabilidade em pessoas menos experientes, por não ouvirem ou não estarem dispostas a dar a atenção adequada.

Se família está atenta às fases de cada pessoa, que dela faz parte, um saberá a melhor forma de comunicar com o outro, em cada tempo. Desentendimentos serão evitados e a comunicação estará mais aberta ao crescimento.